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Rolé Carioca na Fiocruz: um batismo laico no templo da ciência tropical

O Rolé promete uma epifania civil, um culto à ciência sem dogma

Rolé Carioca na Fiocruz

Rolé Carioca na Fiocruz: um batismo laico no templo da ciência tropical


É num Brasil em que a verdade parece um vírus em extinção que o Rolé Carioca — como um profeta desacreditado, mas obstinado — escolhe peregrinar até a Fiocruz. Não é pouca coisa: trata-se de uma travessia até um dos grandes relicários do saber nacional, onde as paredes do Pavilhão Mourisco não só resguardam conhecimento, mas ecoam fantasmas históricos, revoltas sanitárias e sonhos modernistas que nunca se realizaram por completo.


No dia 28 de junho, o convite não é apenas para passear — é para testemunhar. Ali, no coração barroco-oriental da saúde pública brasileira, o Rolé promete uma epifania civil, um culto à ciência sem dogma. A iniciativa gratuita carrega os participantes não só nos ônibus da Cinelândia e da Tijuca, mas também por trilhas invisíveis de memória coletiva, apagamento e potência.


A Fundação Oswaldo Cruz, com sua aura de palácio e seus corredores de laboratório, é talvez a mais simbólica ficção real que o Brasil construiu: um lugar onde a razão e a estética ainda tentam dialogar. Foi ali que se travaram batalhas contra a peste, a febre e a ignorância. E é ali que, séculos depois, ressurge a urgência de narrar a ciência como parte do povo — e não como torre de marfim. Porque o que se herda sem memória, perde-se como mito raso.


A condução do passeio será mais do que uma explicação turística. Será rito. Ao destacar o papel invisibilizado das mulheres cientistas, as tramas afro-islâmicas nas fachadas e os saberes ancestrais indígenas — a caminhada se transforma em um gesto simbólico de reparação. Como se o Rolé dissesse, sem dizer: "A história não é um ponto final, é um parêntese reaberto a cada passo".


Na figura de Oswaldo Cruz — evocado aqui não apenas como nome de instituição, mas como símbolo de uma ciência negra que o Brasil insiste em não enxergar — o projeto se torna político, quase subversivo. Relembrá-lo é reativar a memória de um homem que enfrentou doenças com seringas e multidões com argumentos. Um sanitarista que, ironicamente, virou santo da ciência num país que hoje canoniza o negacionismo.


E é por isso que o Rolé Carioca não é só passeio: é provocação. É um projeto de resgate simbólico num tempo em que o esquecimento é política de Estado. Ao ocupar a Fiocruz com corpos curiosos e olhos abertos, este rolé torna-se um contra-ataque suave — uma romaria leiga em defesa do que nos mantém vivos: o conhecimento, a saúde e a lembrança de que tudo isso, um dia, foi conquista popular.


Se existir ainda esperança de refundar a cidade e seus vínculos com a verdade, talvez ela comece ali — onde Burle Marx plantou jardins para resistir ao concreto, e onde hoje se planta, com cada passo, a ideia de um Brasil que ainda pode se reconhecer em sua própria história.


Serviço

Rolé Carioca - Fiocruz

Data: 28 de junho (sábado), às 10h

Local: Fundação Oswaldo Cruz (Manguinhos) Centro de recepção  - Passeio gratuito


Rolé
1946

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