Mãe Fora da Caixa: Quando a Maternidade Não Vem com Manual
- circuitogeral
- há 3 horas
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“Será que existe devolução? Tem política de troca? Aceitam cashback emocional?”
Mãe Fora da Caixa: Quando a Maternidade Não Vem com Manual
Se “Mãe Fora da Caixa” começasse narrado por mim, eu já entraria avisando: “Minha gente, observem esta mãe. Olheira de guerra, bebê pendurado no peito e seu maior sonho do dia é tomar banho. Não banho aromático, não banho sensorial, não banho de spa. Banho. Cinco minutos. Sem testemunha. Sem palpiteiro. Sem alguém chorando como se fosse sirene de ambulância.”
Manuh Fontes dirige o filme com a sensibilidade de quem já viveu o caos doméstico real, aquele que mistura brinquedos no chão, meia perdida, crise existencial e café frio. Ela abraça o maternar sem fantasia, mostra o amor, sim, mas mostra também o cansaço, as contradições e os surtos silenciosos que toda mãe já teve enquanto sorria por educação.
A protagonista não é aquela mãe instagramável com bebê que parece recém-saído de campanha de fraldas. É uma mulher real, que ama o filho, mas às vezes pensa: “Será que existe devolução? Tem política de troca? Aceitam cashback emocional?” E é aí que o filme brilha, no humor que desarma, acolhe e expõe as expectativas absurdas que a sociedade coloca sobre as mulheres, como se a maternidade viesse com manual, botão de liga e desliga ou plano avançado no aplicativo da vida.
Miá Mello carrega o filme com uma verdade tão grande que parece estar improvisando a partir da vida real. Ela equilibra desespero, ternura e aquele olhar de “eu amo meu bebê, mas hoje estou por um fio” com uma precisão que faz rir e reconhecer. É graça com profundidade, leveza com sinceridade, uma atuação que traduz a mulher antes da mãe, durante a mãe e apesar da mãe.
Danton Mello aparece como o parceiro bem-intencionado, aquele que ajuda, mas às vezes só quando pedem três vezes. Ele entrega humanidade, humor e um retrato bastante fiel do homem contemporâneo que tenta compreender o caos do pós-parto sem manual. O charme está justamente na tentativa constante, um misto de confusão, boa vontade e a cara de “eu juro que pensei que estava ajudando”.
Xando Graça entra com um timing cômico certeiro, do tipo que fala o que ninguém quer ouvir, mas que todo mundo sabe que é verdade. Seu humor é fino, suas intervenções são precisas e ele funciona como contraponto inteligente ao turbilhão emocional da protagonista. Cada cena acrescenta ritmo, ironia e uma pitada de realidade que faz o público se identificar instantaneamente.
“Mãe Fora da Caixa” não quer ensinar ninguém a ser mãe. Não quer aconselhar, doutrinar ou romantizar. O filme simplesmente estende a mão e diz: “Tá difícil pra você? Relaxa. Pra todo mundo tá. Senta aqui, toma um café frio e vamos rir juntos desse caos perfeitamente humano.” Com humor afiado, direção sensível e um elenco em sintonia absoluta, o longa entrega identificação, ternura e verdades que finalmente cabem no mundo real.
Por Paulo Sales




