Agora Inês é Morta: Inês Volta Para Gritar Que o Amor Não Redime — Corrói | Teatro | Crítica
- circuitogeral
- há 1 dia
- 3 min de leitura
Um espetáculo que se infiltra pela pele do espectador com unhas sujas de passado, rasga o pano da cortina e costura a ferida com linha embebida em sangue antigo

Deliremos juntos — pois essa peça não pede crítica, ela exige rituais. Abaixo, uma pontuação de ranking para cada ponto positivo e negativo de Agora Inês é Morta, em escalas tão febris quanto a própria encenação.
PONTOS POSITIVOS
1. Texto de Claudio Torres Gonzaga
“Abriu uma fenda na História até alcançar os ossos de Inês.” Nota: 10/10
Gonzaga não escreve, ele arqueologiza sentimentos. A dramaturgia é uma carta psicografada entre o barro e o além. Merece ser lida com luvas — de couro e de luto.
2. Direção de Adriana Nunes
“Cada respiração, um exorcismo ao avesso.” Nota: 10/10
Nunes dirige com sal grosso e olhos revirados. Um espetáculo que não anda — rasteja. Ela invoca o teatro como um demônio íntimo.
3. Atuação de Adriana Nunes como Inês
“Delicadeza resignada de flor sobre um túmulo.” Nota: 9.8/10
Ela não interpreta Inês: ela a canaliza. Uma performance que fede a eternidade, como se a alma vestisse o corpo para um último lamento.
4. Atuação de André Deca como Pedro
“Desfaz da técnica para dar lugar a uma catedral em ruínas.” Nota: 9.5/10
Deca entrega ruína com um olhar que já nasceu órfão. Atua como se tivesse perdido a fé e achado o túmulo certo.
5. Atuação de Rosanna Viegas (Santa Isabel)
“Feita de ar e saudade.” Nota: 9/10
Ela não fala, ela roga. É um eco sacro que nos alcança como um lamento ancestral. Uma santa que não salva — apenas observa.
6. Cenografia e Figurinos de Nello Marrese
“Com cheiro abafado de armário de convento.” Nota: 10/10
Nello veste o palco como se fosse um corpo a ser velado. Cada tecido carrega pólen de memória e cheiro de missa das seis.
7. Iluminação e Som de Marcello Linhos
“A música carrega o silêncio denso da água de cemitério.” Nota: 10/10
Nada é revelado — tudo é insinuado. Um trabalho técnico que embalsama o olhar do público com sombra e efeito reverb.
8. Pesquisa de Fernando Bueno
“Violou criptas simbólicas.” Nota: 8.5/10
Transformar pesquisa em necromancia não é tarefa fácil. Bueno escava o passado e o serve fresco, ainda sangrando.
9. Conceito geral: O Amor como Praga
“Não como redenção, mas possessão incurável.” Nota: 10/10
Finalmente um espetáculo que entende: o amor verdadeiro é parasitário. Eterno. Doente. Sublime.
PONTOS NEGATIVOS
1. Densidade extrema da linguagem e da encenação
“Não é teatro que se aplaude — é teatro do qual se sobrevive.” Nota: 3/10
A peça não faz concessões. Para alguns, isso é virtude. Para outros, martírio. Exige do espectador não só presença, mas entrega total — e talvez um pacto de sangue.
2. Possível hermetismo para públicos leigos
“Uma confissão em forma de espasmo.” Nota: 4/10
Delírios de Comunicação Para quem não tem familiaridade com a história de Pedro e Inês, ou com teatralidades não realistas, o espetáculo pode parecer um delírio sem tradução.
3. Ritmo por vezes opressor
“Cada marcação de cena é um ritual.” Nota: 5/10
A intensidade constante pode anestesiar ou esmagar. O espetáculo raramente respira — e arrasta o público por um luto contínuo que pode cansar até os fantasmas.
“Agora Inês é Morta” recebe 9.5/10
Um espetáculo que não quer agradar. Quer marcar. Não toca o público — enterra um pouco dele.
Por Paulo Sales

Comments