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Agora Inês é Morta: Inês Volta Para Gritar Que o Amor Não Redime — Corrói | Teatro | Crítica

Um espetáculo que se infiltra pela pele do espectador com unhas sujas de passado, rasga o pano da cortina e costura a ferida com linha embebida em sangue antigo

Agora Inês é Morta

Deliremos juntos — pois essa peça não pede crítica, ela exige rituais. Abaixo, uma pontuação de ranking para cada ponto positivo e negativo de Agora Inês é Morta, em escalas tão febris quanto a própria encenação. 


PONTOS POSITIVOS 


1. Texto de Claudio Torres Gonzaga

“Abriu uma fenda na História até alcançar os ossos de Inês.” Nota: 10/10 

Gonzaga não escreve, ele arqueologiza sentimentos. A dramaturgia é uma carta psicografada entre o barro e o além. Merece ser lida com luvas — de couro e de luto.


2. Direção de Adriana Nunes

“Cada respiração, um exorcismo ao avesso.” Nota: 10/10 

Nunes dirige com sal grosso e olhos revirados. Um espetáculo que não anda — rasteja. Ela invoca o teatro como um demônio íntimo.


3. Atuação de Adriana Nunes como Inês

“Delicadeza resignada de flor sobre um túmulo.” Nota: 9.8/10

 Ela não interpreta Inês: ela a canaliza. Uma performance que fede a eternidade, como se a alma vestisse o corpo para um último lamento.


4. Atuação de André Deca como Pedro

“Desfaz da técnica para dar lugar a uma catedral em ruínas.” Nota: 9.5/10

 Deca entrega ruína com um olhar que já nasceu órfão. Atua como se tivesse perdido a fé e achado o túmulo certo.


5. Atuação de Rosanna Viegas (Santa Isabel)

“Feita de ar e saudade.” Nota: 9/10 

Ela não fala, ela roga. É um eco sacro que nos alcança como um lamento ancestral. Uma santa que não salva — apenas observa.


6. Cenografia e Figurinos de Nello Marrese

“Com cheiro abafado de armário de convento.” Nota: 10/10 

Nello veste o palco como se fosse um corpo a ser velado. Cada tecido carrega pólen de memória e cheiro de missa das seis.


7. Iluminação e Som de Marcello Linhos

“A música carrega o silêncio denso da água de cemitério.” Nota: 10/10 

Nada é revelado — tudo é insinuado. Um trabalho técnico que embalsama o olhar do público com sombra e efeito reverb.


8. Pesquisa de Fernando Bueno

“Violou criptas simbólicas.” Nota: 8.5/10 

Transformar pesquisa em necromancia não é tarefa fácil. Bueno escava o passado e o serve fresco, ainda sangrando.


9. Conceito geral: O Amor como Praga

“Não como redenção, mas possessão incurável.” Nota: 10/10 

Finalmente um espetáculo que entende: o amor verdadeiro é parasitário. Eterno. Doente. Sublime.



PONTOS NEGATIVOS 


1. Densidade extrema da linguagem e da encenação

“Não é teatro que se aplaude — é teatro do qual se sobrevive.” Nota: 3/10 

A peça não faz concessões. Para alguns, isso é virtude. Para outros, martírio. Exige do espectador não só presença, mas entrega total — e talvez um pacto de sangue.


2. Possível hermetismo para públicos leigos

“Uma confissão em forma de espasmo.” Nota: 4/10

Delírios de Comunicação Para quem não tem familiaridade com a história de Pedro e Inês, ou com teatralidades não realistas, o espetáculo pode parecer um delírio sem tradução.


3. Ritmo por vezes opressor

“Cada marcação de cena é um ritual.” Nota: 5/10 

A intensidade constante pode anestesiar ou esmagar. O espetáculo raramente respira — e arrasta o público por um luto contínuo que pode cansar até os fantasmas.


“Agora Inês é Morta” recebe 9.5/10 

Um espetáculo que não quer agradar. Quer marcar. Não toca o público — enterra um pouco dele.


Por Paulo Sales


Inês
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