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1300° Qual é a saúde de um vulcão?: A anatomia do colapso como gênese de futuro | Teatro

O solo treme sob os pés do espectador mesmo antes que qualquer palavra seja dita

1300° Qual é a saúde de um vulcão?

1300° Qual é a saúde de um vulcão?: A anatomia do colapso como gênese de futuro | Teatro


Existe algo de sísmico em “1300° Qual é a saúde de um vulcão?”, o solo treme sob os pés do espectador mesmo antes que qualquer palavra seja dita. A obra de Malu Avelar não se contenta em habitar a cena — ela incendeia estruturas. O espetáculo, em cartaz no Teatro Sesc Tijuca, não busca respostas fáceis sobre saúde, corpo ou regeneração. Ele escolhe o atrito, o esfacelamento, o caos como matéria-prima. E, nesse gesto, implode o palco como zona de conforto para transformá-lo em laboratório vulcânico: o teatro como cratera.


Malu Avelar dança com o impossível. Seu corpo, tensionado até o limite, se torna metáfora viva da Terra prestes a romper. Ao manusear a argila, ela não modela — ela convoca. Cada gesto é um embate com a forma, com a história, com a colonialidade que domesticou o corpo humano ao custo de sua própria saúde. A pergunta que dá título ao espetáculo (“Qual é a saúde de um vulcão?”) não busca medir temperatura. Ela expõe uma falácia: de que saúde seria estabilidade. Avelar afirma o oposto — saúde pulsa no instável, no que treme, no que se rasga para permitir passagem.


A performance é vulcanicamente estrutural. Em vez de construir narrativas lineares, ela e sua equipe constroem fissuras: abrem espaço para que o espectador caia, escorregue, confronte-se. A dramaturgia é topográfica, esculpida com a densidade de magma prestes a se mover. Os corpos, como a própria lava, desafiam formas fixas e apontam para o porvir do humano — ou talvez para sua ruína necessária.


Neste espetáculo, o corpo não é mais o sujeito central da cena, mas um campo de forças. Um território em disputa, tensionado pelas pressões do racismo, do gênero, da normatividade e do sistema capitalista que suprime o incontrolável. Avelar, ao convocar a imagem do “corpo-bomba”, não fala de destruição violenta, mas de uma implosão necessária — o estopim de uma nova cartografia sensível. A cena em que a argila se desfaz nas mãos da artista não é meramente estética: é epistemológica. Trata-se de descolonizar o gesto, devolver à matéria o seu direito de resistir à forma.


Há também, de forma ardente, uma ética do imprevisível. “1300°” não ensina, não doutrina, não simplifica. Em vez disso, propõe uma escuta sísmica do corpo, da terra e do outro. Em tempos de colapso ambiental, de regressões políticas e de esgotamento das noções convencionais de saúde, a peça rasga os limites da linguagem e propõe: que tal acolhermos o disforme como possibilidade de cura?


A estética do espetáculo é visceral. Sons telúricos, luzes intermitentes e silêncios densos compõem um ambiente onde a sensorialidade precede o entendimento racional. É necessário desaprender para assistir. E, talvez por isso, o espetáculo seja também um rito — um convite à desprogramação do olhar.


Malu Avelar emerge aqui como uma das artistas mais radicais e necessárias da cena contemporânea brasileira. Radical não por gritar mais alto, mas por escavar mais fundo. “1300°” não é apenas um espetáculo: é uma cratera aberta na carne da cultura. E ali, entre lava e fragmentos, pulsa a pergunta sem resposta: como curar um corpo que ainda não se permitiu explodir?


1300° Qual é a Saúde de um Vulcão? de Malu Avelar 

Dias 29, 30 e 31 de maio de 2025 às 19h e 1 de junho de 2025 às 18h Sesc Tijuca - Teatro II 

Endereço: Rua: Barão de Mesquita, 539 - Tijuca, Rio de Janeiro - RJ, 20540-001 Entrada gratuita - retirar ingresso na bilheteria 

Duração: 45 minutos 

Classificação etária: 12 anos




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