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Quando o Céu se Engana — O milagre da meritocracia falida

Uma comédia com alma de revolução e cheiro de capuccino vegano

Quando o Céu se Engana — o milagre da meritocracia falida


Aziz Ansari resolveu fazer um filme sobre desigualdade social, mas em vez de um panfleto, ele entregou uma comédia com alma de revolução e cheiro de capuccino vegano. Quando o Céu se Engana é o tipo de obra que faz você rir, refletir e, no fim, querer mandar um e-mail pro anjo da guarda pedindo reajuste salarial.


A trama é simples: um anjo (Keanu Reeves, o mais sereno funcionário público do céu) decide inverter as vidas de dois homens. Arj (Ansari), o trabalhador ferrado que vive tentando sobreviver, e Jeff (Seth Rogen), o milionário entediado que sofre porque o Wi-Fi da mansão cai às vezes.


O que poderia ser só uma comédia de “troca de corpos” vira um experimento sociológico com risadas. Ansari usa o humor para cutucar um tema bem pouco engraçado: o mito da meritocracia. Porque, convenhamos, se “basta se esforçar”, o cara do iFood já era pra estar de Tesla na garagem.


Quando o pobre vive a vida do rico, descobre que “trabalhar muito” é coisa de quem não tem herança. Quando o rico cai na pele do pobre, entende que “ter empatia” é fácil até precisar pagar boleto.


O filme não tenta dourar a pílula: o sistema é um milagre que só funciona para quem já está com a vida ganha.


O roteiro é afiado e autoconsciente, ri da desigualdade sem rir de quem sofre com ela. Tem piadas sobre coaching, aplicativos, espiritualidade de Instagram e aquele discurso de “empreendedor de si mesmo” que todo mundo já ouviu do tio no churrasco. Aziz Ansari não aponta o dedo, ele segura o espelho e diz:

“Olha aí, você também acredita que vai dar certo trabalhando 14 horas por dia.”


E o pior é que a gente ri… porque a verdade é irônica.


Keanu Reeves como anjo é uma sacada genial. Ele é o mensageiro celestial mais cansado desde Constantine. Parece que veio do céu direto pra um plantão no INSS divino: confuso, burocrático e sem tempo pra lidar com tanta desigualdade. Ele representa uma força superior que tenta ajudar, mas nem o celestial tem plano para consertar o capitalismo.


No fim, Quando o Céu se Engana, não te promete catarse nem milagre. Ele só esfrega na sua cara uma verdade simples: o mundo é desigual, o sistema é cruel, e rir talvez seja o único jeito de não surtar.


Entre risadas e tapas de realidade, Quando o Céu se Engana prova que humor é uma das formas mais honestas de fazer política. É um lembrete de que, se um anjo aparecer e disser “sua sorte vai mudar”, desconfie, ele provavelmente errou o CEP.


Por Paulo Sales


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