Filhos - Quando o drama psicológico cede à falta de lógica | Crítica | Cinema
- circuitogeral
- há 4 dias
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A tensão é construída sobre um encontro improvável — e altamente questionável
Filhos - Quando o drama psicológico cede à falta de lógica | Crítica | Cinema
O novo filme do dinamarquês Gustav Möller (Culpa) chega com a promessa de um thriller psicológico intenso, ambientado dentro de uma prisão, onde o passado bate de frente com o presente de maneira explosiva. Em “Filhos”, a tensão é construída sobre um encontro improvável — e altamente questionável: uma guarda prisional descobre que o novo detento sob sua vigilância é o jovem assassino de seu filho.
Essa premissa já levanta sobrancelhas, e com razão. Mesmo concedendo ao cinema suas licenças poéticas, é difícil aceitar que um sistema prisional organizado como o da Dinamarca permitiria tal situação. Mas “Filhos” pede que o espectador compre essa lógica — e faz disso o eixo de toda a sua história.
Diferente de “Culpa”, onde Möller usava o mínimo de recursos para causar o máximo de tensão, aqui o diretor aposta em artifícios visuais e dramáticos para garantir o impacto. O problema é que, em vez de confiar na sutileza, o filme recorre a sublinhados: tudo é muito explicado, muito previsível. A cada nova cena, é fácil prever para onde o roteiro vai, o que diminui bastante o impacto emocional.
Apesar disso, o filme levanta discussões interessantes: como lidar com a dor irreparável? É possível perdoar o imperdoável? O problema é que essas questões ficam no rascunho, abafadas por um enredo que prefere conduzir o espectador pela mão, em vez de desafiá-lo a pensar por conta própria.
Se o roteiro falha, as atuações seguram o barco. Sidse Babett Knudsen, entrega uma performance contida e poderosa como Eva, a guarda devastada pela perda do filho. Mesmo nos momentos mais absurdos do roteiro, ela mantém a dignidade da personagem com uma atuação carregada de tensão e dor silenciosa.
Sebastian Bull também surpreende no papel de Mikkel, o jovem preso com comportamento agressivo e imprevisível. Bull acerta ao compor um personagem que transita entre o ameaçador e o infantil, o que confere camadas a um papel que, nas mãos erradas, poderia ser apenas unidimensional.
Filmado na desativada prisão de Vridsløselille, em Copenhague, o longa acerta na ambientação. O espaço fechado, a arquitetura opressora e o design de som ajudam a criar uma atmosfera de constante tensão, reforçando a sensação de claustrofobia emocional que Eva vivencia. A prisão aqui não é apenas um cenário, mas um reflexo da condição interna dos personagens.
O maior problema de “Filhos” talvez seja sua incoerência interna. Eva comete uma série de abusos — como plantar drogas, manipular comida e até agredir brutalmente um preso — sem qualquer consequência. São situações que exigem uma suspensão de descrença difícil de sustentar, e que fragilizam a força do drama. Tudo parece estar ali apenas para manter a dupla protagonista próxima, custe o que custar.
“Filhos” tenta discutir temas importantes — como a dor do luto, o desejo de vingança e os limites do perdão —, mas tropeça justamente onde deveria ser mais firme: na construção lógica e emocional de sua história. Há talento na direção, ótimas atuações e um clima tenso bem executado. Mas o excesso de manipulação e a falta de credibilidade em pontos-chave tiram do filme o peso que ele tanto deseja ter.
Nota: 2 de 5 estrelas
Por Paulo Sales

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