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“Vital: O Musical dos Paralamas”: Uma trajetória de luzes e cicatrizes

Atualizado: há 3 dias

Uma imersão na história de uma das bandas mais importantes do rock brasileiro

Vital – O Musical dos Paralamas

“Vital: O Musical dos Paralamas”: Uma trajetória de luzes e cicatrizes


“Vital: O Musical dos Paralamas” é muito mais do que uma homenagem; é uma imersão sensorial e afetiva na trajetória de uma das bandas mais importantes do rock brasileiro. O espetáculo consegue condensar décadas de carreira, sucessos, tragédias e relações pessoais sem perder a leveza ou deslizar para a caricatura. Cada cena parece moldada com cuidado cirúrgico para transmitir emoção e autenticidade, sempre evitando o caminho fácil dos excessos e respeitando a inteligência e a sensibilidade do espectador.


Desde o início, quando reencontramos Herbert Vianna em um leito hospitalar após o acidente que o afastou temporariamente do palco e da vida pública, fica evidente que a autora Patrícia Andrade, com colaboração de Marcelo Pires, e o diretor artístico Pedro Brício fazem uma escolha madura: a história não é sobre o acidente, mas sobre tudo o que o antecede e o transcende. A dramaturgia pinça momentos essenciais e guia o público por uma jornada de cerca de 150 minutos que equilibra, com precisão rara, drama contido, narrativa temporal clara e números musicais integrados, números que esclarecem o que a palavra não explica e que revelam, pela música, a essência de cada etapa da formação e ascensão dos Paralamas.


A direção musical e os arranjos de Daniel Rocha dialogam organicamente com a coreografia de Marcia Rubin, entregando ao público uma fusão entre som e movimento que ecoa muito além da partitura.


Pedro Brício assina uma direção apaixonada, porém jamais complacente. Ele confere relevância a cada personagem como se cada um fosse protagonista de sua própria trajetória, e a narrativa se torna um mosaico vivo. A cenografia de André Cortez abre múltiplas camadas para que essa história respire, servindo-se da tecnologia com precisão, enquanto a iluminação de Paulo Cesar Medeiros desenha atmosferas que ampliam a dramaturgia sem nunca a atropelar. O figurino de Karen Brusttolin revela a despretensiosa ambição do trio no início da carreira, traduzindo com honestidade o espírito dos anos 80. Tudo isso encontra sustentação no desenho de som de João Paulo Pereira e no visagismo de Beto Carramanhos, que completam a coerência estética do espetáculo.


O elenco se apresenta como um organismo vivo. Rodrigo Salva oferece um Herbert Vianna que fascina não por imitação, mas por presença, um protagonista que cede espaço para que todos brilhem. Seu semblante, sua musicalidade interna e sua condução emocional ultrapassam em muito o mero uso dos icônicos óculos vermelhos. Franco Kuster transita entre dramaturgia e pantomima com brilhantismo; sua composição como João Barone em cena é tão precisa que se torna espetáculo dentro do espetáculo. Já Gabriel Manita empresta à cena um Bi Ribeiro de carisma generoso, funcionando como a liga sensível que solidifica o trio.


É justamente essa base sólida que potencializa a força emocional do espetáculo. Não há manipulação sentimental, mas uma construção tão orgânica que o público se vê arrebatado progressivamente, sem perceber que foi conduzido a uma zona de maior vulnerabilidade. As músicas emergem como capítulos emocionais, a história flui com ritmo exemplar e a trajetória de Herbert Vianna, em toda a sua complexidade humana, é tratada com rigor, verdade e afeto. “Vital” emociona porque respeita: respeita a arte, a memória e o público.


Em última análise, “Vital: O Musical dos Paralamas” não apenas cumpre o que promete, mas supera. Constrói uma experiência cênica em que memória, música e dramaturgia se entrelaçam com precisão rara, devolvendo ao público não a lembrança de uma banda, mas a vitalidade de um acontecimento cultural que segue pulsando. O espetáculo opera com a consciência de que revisitar uma trajetória icônica não exige piedade, mas verdade; não pede reverência, mas rigor. E é justamente essa combinação, a coragem de olhar de frente, a inteligência de costurar emoções sem apelos fáceis e a potência de uma criação artística que se sustenta por si, que transforma este musical em uma celebração inegociável da história dos Paralamas do Sucesso.


“Vital” se estabelece como um espetáculo memorável não pelo que revive, mas pelo que reacende. E isso, no teatro musical brasileiro, é um feito para poucos.



Por Paulo e Mauro Senna


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